Documentário “Depois do Fim” apresenta um paralelo de abandono entre a história da ferrovia e de um maquinista

O Theatro Treze de Maio foi palco para a exibição do filme “Depois do Fim”. O documentário de Alvaro de Carvalho Neto, conta a história de Evaristo, ex-comandante de trem da Viação Férrea do Rio Grande do Sul, que com sua idade avançada faz um paralelo cheio de reflexão sobre o abandono das ferrovias e a iminente finitude da vida.

A sessão, que fez parte da programação da Feira do Livro de Santa Maria, trouxe uma das fases mais marcantes da cidade, onde teve seu desenvolvimento fortemente atrelado às chegadas e partidas na Estação da Gare.”Santa Maria é o que é por dois motivos: primeiro pelas ferrovias no início do século e depois pela Universidade Federal de Santa Maria, quando a anterior já começou a entrar em declínio. Para mim foi uma honra muito grande participar da Feira do Livro, para que mais pessoas percebam toda essa riqueza e memórias históricas que temos, que passa pelo material como prédios, o entorno da estação, a estrutura e ruas da cidade”, declara Alvaro, diretor e roteirista da produção.

Quem assistiu, certamente teve seus sentimentos mais melancólicos despertados com a história de seu protagonista, que fora esquecido com o tempo. O diretor do documentário contou à reportagem como foi a produção e a descoberta da figura de Evaristo. “Como todo documentário, a gente começa pela pesquisa, partimos de uma ideia que temos interesse em esclarecer. E foi a partir da pesquisa que cheguei ao seu Evaristo, nosso maquinista. A partir desse encontro que a narrativa do filme foi estabelecida. Ele tinha um paralelo de abandono com as ferrovias que, como eu disse no início do filme, tinha certeza de que ele era o personagem do filme. Infelizmente não conseguimos acabar o projeto juntos, mas essa narrativa toda de abandono, a forma que filmamos, com planos estáticos e longos, usando uma lente analógica que dá essa visão mais ampla, inseriram a impressão de solidão e abandono”, refletiu.

Questionado sobre o que vem após o fim, Alvaro é positivo. “A ferrovia não teve fim. Fomos paulatinamente perdendo o transporte de passageiros, que começou nas décadas de 1960 e 1970 e foi extinta em 1990 no Estado. As ferrovias ainda existem, existe transporte intermunicipal em Porto Alegre e em outras cidades e capitais do país, onde as ferrovias persistem, modernizadas. Existe uma possibilidade dessa história ser retomada e com muitos benefícios ao Brasil. Basta ver que, mesmo com essas linhas que são deficitárias em termos de capacidade e velocidade, existe uma empresa que acabou de renovar o contrato de concessão por mais de 20 anos para utilização dessas linhas”, enfatizou.

Documentário "Depois do Fim" - Foto: Ronald Mendes
Documentário “Depois do Fim” – Foto: Ronald Mendes

Além do enredo de decadência das ferrovias, o tema do filme está relacionado a um personagem que tem uma história de abandono pessoal e de sua profissão “O filme fala do trato com nossos idosos, como uma memória imaterial que estamos perdendo e com todas questões que envolvem a história e o bem estar deles. Esse é um ponto que também faz parte da narrativa que o Evaristo trouxe. Por isso que abandonei todos os depoimentos de outros ferroviários para trazer essa visão”, salienta.

Alvaro, ao finalizar a nossa conversa, relembra sua relação com a Feira do Livro de Santa Maria e elogia a programação deste ano, onde também apresenta um resgate histórico dos personagens da cidade. “Em relação ao Elias Monteiro, eu tive a honra de fazer a identidade visual e a produção gráfica da Feira do Livro, através da Facos-UFSM, lá na década de 90, nos primeiros anos da retomada da feira. Na ocasião, convidei o Elias para ilustrar o material. Tal como ocorreu este, ano ele deu um show, e o tema também era o chafariz da Saldanha Marinho, com a chamada: Está aberta a temporada. Em relação ao Joel Saldanha, o que dizer? Pioneirismo e arte inventiva pura. O trabalho que a TV OVO e a Luiza Haesbaert fazem são preciosos. Trazer à luz esse artista é mais que um dever de Santa Maria. Por fim, gostaria de prestar minhas homenagens ao nosso querido Guido Isaia, que também deixou um legado na arte cinematográfica de Santa Maria, além de sempre apoiar toda manifestação de cultura na cidade. Não houve um filme meu que ele não tenha de alguma forma incentivado. Santa Maria deve reverenciar esse grande homem”, conclui.

Quem não pode acompanhar a exibição de “Depois do Fim”, ainda pode assistir em casa. O filme está disponível nas plataformas Vimeo, Vivo Play, Sky Play e Now.

 

Texto: Nathália Arantes – acadêmica de jornalismo da UFN

Jornalista responsável: Liciane Brun – MTB 16.246