sexta-feira, dezembro 6, 2024
Feira Do Livro 2016TODAS EDIÇÕES

A CAMILA É FASCINANTE E DEIXA A GENTE FASCINADA!!!

Não somos uma só. Somos várias, várias pessoas em uma”, provocou Camila Borges. Buscando em minhas intenções, quase afirmei ser uma colocação proposital, pois nos ouvidos – que escutam aquilo que querem – ficou a frase a reforçar o motivo dos quase 50 minutos de monólogo.

Ela, a propósito, já passou por essa e outras experiências que exigiram força para sustentar o peso da dramaturgia. Um pouco paradoxal, foi a densidade dos textos que enveredou a moleca pelos caminhos pueris: “na academia, os trabalhos foram voltados inteiramente para os adultos. E foi isso que ajudou a descobrir minha paixão pelas crianças”.

A colcha de retalhos que personifica Camila Borges foi o motivo pelo qual esse texto nasceu. Na pretensão de descobrir quantas personagens cabiam em uma atriz, acabei descobrindo quantas Camilas existem e servem como complemento as suas performances. Multifacetada, a mestre em Educação também é mestre em ilusão de ótica: “80% do meu tempo é dedicado ao trabalho. Abraço muitos compromissos e, naturalmente, acaba respingando em algo ou alguém. Mas eu adoro isso. Então acabei criando pequenos espaços que permitissem ser eu mesma, já que eu e meu trabalho, quase sempre, somos um só”.

Sempre inquieta, a Bacharel em Artes Cênicas e Interpretação Teatral pela UFSM foi também sempre convicta. Sem duvidar de seu futuro, ela nunca titubeou ao falar de arte e cultura. Tanto que, em resposta as suas convicções, foi na universidade que o destino chegou acenando em quatro mãos. Jader Guterres e Luciano Gabbi brindaram, com a professora (!), à felicidade: “volta e meia a gente se convidava pra fazer trabalhos, então por que não formar uma Companhia? Assim nasceu a Saca-Rolhas Teatro e Cia. Nós somos a formação original, embora o Jader e Denise (Copetti) tenham começado e colocado o nome, que remete a estouro de champagne, à festa, à alegria”.

Com uma década de trajetória e mais alguns convidados, “a trinca permaneceu. Somos a cabeça que pensa, que articula, que trabalha a concepção daquilo que vai para o palco, mas sempre contando com outros profissionais. O mais bacana disso tudo é que, com outras pessoas, a Cia. respira e no fim estamos os três juntos, renovados e com uma bagagem muito maior”, comemora. Pandorga da Lua e Jardim de Cataventos são algumas das conquistas fruto do profissionalismo dessa turma: “o Pandorga apareceu pro Gabbi; o Jardim e agora o Baú, Brasil Criança pra mim. São exemplos de como nos consolidamos como Companhia, mas, ainda mais, como artistas”.

Como dito há algumas linhas, Camila Borges é professora. Após concluir o curso em 2007, seguiu obstinada em busca de mais: “me perguntei se havia terminado tudo logo que me formei. Não era possível”, e foi desbravar a Pedagogia até o 5° semestre, quando não pôde mais conciliar. O que não impediu a moça de se aventurar pelas salas de aula: “passei em um concurso para professora substituta e aumentei meu fascínio. A educação amplia o olhar e apura os sentidos. Transforma nossa concepção sobre a vida. Lecionar é passar um marca-texto sobre aquilo que eu acredito: as relações interpessoais. Essa foi e é a fase mais importante da minha vida”, e fala com o brilho do olho.

Camila, que lecionou entre 2008 e 2011 para crianças em vulnerabilidade social, continua desafiada pelo ensino: “foram quatro anos em convívio com pessoas de 8 a 18 anos. Foi o choque social que me despertou como professora. No começo era mais intuitivo, pois não tinha tanto contato com teoria. Mas existe uma Cia. que me alimenta e existem alunos dos quais eu alimento os sonhos. Reinvento o tempo inteiro e faço isso porque acredito”. A professora-atriz lidera a turma de especialização em Docência na E           ducação Infantil e se arrisca nos cursos de Pedagogia e Educação Especial através do Ensino à Distância. “Trabalhar o conhecimento no ambiente virtual é conceber outra proposta e crer que ela funciona. Sou professora-atriz, com hífen, porque tudo está contido. Falar de quem sou hoje sem falar em todas as etapas pelas quais passei é praticamente impossível”.

INFINDÁVEIS CAMILAS

Pauta Fria Camila Borges_Fotos Fernanda Gonçalves (0)

Camila Borges perdeu as contas de quantos papeis assumiu. “Mas me apresento sempre como se fosse a primeira vez porque o público merece”. Sem esmorecer, a menina levada dá lugar à maturidade da mulher que equilibra as relações entre o grupo: “Na Saca-Rolhas tenho jogo de cintura, pois sou a figura feminina. Os meninos têm a personalidade forte. Já no Jardim quem me passa tranquilidade é o Marcelo (Schmidt). Recrio a mim mesma toda vez que me posiciono, independente de onde estou. Somos uma família, a intimidade é consequência. Não tememos o que o outro vai pensar”.

Como Branca de Neve, Emilia (Sítio do Picapau Amarelo) e Dorothy (O Mágico de Oz), Camila invocou alguns clássicos da literatura infantil. Mas, embora pareça fácil, a crítica é indissociável. A construção de cada espetáculo passa pelo crivo daqueles que o compõem: “adoramos o frescor que só a criança tem, mesmo que o ator viva sempre à beira do abismo. Eles acreditam nas histórias? É isso que interessa. Discutimos os textos e aprofundamos certas passagens, mas é o clichê, o piegas, que funciona. Nos preocupamos com discussões até a página dois. Por mais que eu saiba da minha potência como atriz, isso não faz sentido para eles. O que importa, e não só para as crianças, mas pra gente também, é que a cena alcance o objetivo”. Releituras contemporâneas também integram um repertório que se propõe a contemplar todos os aspectos literários.

“Não mudaria nada. Minha (des)rotina é o que me mantém em pé”, conclui a mais linda personagem da vida real.  “O que fica de tudo é o que construímos para nós. Sempre fui alicerçada por pessoas muito especiais, e é isso que me faz levantar e movimentar. Quero seguir conquistando porque batalhei. Se permanecemos aqui é porque temos contundência. Não é carcaça, é conteúdo”.


ASSESSORIA DE IMPRENSA – UNIFRA
TEXTO: jornalista Rúbia Keller
FOTO: Laboratório de Fotografia e Memória/Fernanda Gonçalves
PROFESSOR RESPONSÁVEL: jornalista Bebeto Badke (MTB 5498)