NOITE DE ESCUTAR A ESCUTADEIRA
O auditório do Hotel Itaimbé estava lotado para ouvir a escritora, jornalista e documentarista Eliane Brum. Entre os anos de trabalho na revista Época, Zero Hora, cinco livros de não-ficção e romance e sua atual função no jornal El País e colaboração no britânico The Guardian, além de muitas histórias ainda guardadas, Eliane selecionou algumas para conversar com as quase mil pessoas que a acompanharam atentas e em silêncio respeitador: “Sou uma contadora de histórias, consigo responder quem sou eu, em palavras, com essas histórias”, explica.
Eliane abriu a noite com “Marielle, presente”, o que faz desde a morte da vereadora como um protesto contra a não resolução do caso até os dias de hoje. A seguir, discorreu sobre a busca por definição de si mesma e do que a levou a ser jornalista, contou histórias da família e da infância. “Eu escrevo para não matar e para não morrer”, declara.
O maior foco dos textos de Brum são pessoas ‘normais’ que têm histórias extraordinárias que se conectam e explicam o contexto do Brasil e do mundo. Ela desvenda: “Não existem vidas comuns, existem olhos domesticados.” A jornalista, ao explicar sobre olhar para as pessoas, fala do tempo que envolve esta prática e do cuidado com o que vai dizer, sendo necessário mais ouvir: “Acompanhei alguém com câncer por 115 dias, é só descobri que ela nunca pronunciou o nome da doença dela porque eu nunca perguntei sobre isso usando esta palavra.” Assim, Eliane se define como uma ‘escutadeira’. Ela também abordou as posições de conforto dentro do jornalismo. “Quando tudo está muito confortável, eu fico desconfortável. Eu já saí de empregos nestes momentos, quando quis mudar”, revela Eliane.
Destas mudanças, surgem os trabalhos autofinanciados que realiza, que se dão através de economias e palestras, como suas experiências de Brum na periferia de São Paulo e nas comunidades de Altamira, ao redor da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará:“Eu já arrisquei muito e deixei bons cargos para isto. Nós sempre fazemos escolhas para perder algo e essa geração precisa entender isso, eu já entendi”.
Sobre seu seu trabalho atual ela é certeira: “Em relação ao o que escuto, tenho que duvidar de mim, me descontruir. Além disso, só digo algo se acho que ninguém já disse aquilo ou, ao menos, da forma que posso dizer. Minha coluna parte de uma escuta que faço de vários ‘Brasis’.
Ao final, a jornalista e escritora multipremiada elucida a respeito a influência climática que todo o mundo vive., Explica que o centro do planeta, onde o que há de mais importante para ser visto, é a Amazônia, onde mora para trabalhar, por perceber a importância do local através dos tantos casos de injustiça que acontecem lá.
No momento aberto para perguntas do público, a jornalista foi muito questionada sobre sua perspectiva frente ao cenário político atual: “Temos que fazer tudo imperativamente, e a esperança, neste momento, é um luxo.” Eliane, que enxerga a política através dos olhos de quem convive com ribeirinhos, diz que aprendeu com eles, a melhor forma de resistência: a alegria.
A psicanalista Mariana Dias, 37, que acompanha os trabalhos e palestras de Eliane, diz que, para ela, o que mais marca na fala de Brum é a coerência e a atualidade correspondentes à atualidade.
As colegas do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Amanda Antonette, 20, e Kellen Espíndola, 22, saíram da palestra encantadas: “Ela nos tira o desespero acerca do momento político pelo qual o país passa, trazendo clareza”, revela Amanda. Elas contam também que as temáticas trabalhadas por Eliane vão ao encontro do que pesquisam no curso. “Acompanho a Eliane no twitter e também jornalisticamente, e gosto muito de como ela trata de política. Ela é a pessoa que pode mostrar um caminho a seguir”, acredita Kellen.
Texto elaborado pela acadêmica de Jornalismo/UFN Gabriele Bordin
Foto: Thayane Rodrigues/LABFEM-UFN
Professor responsável: Jornalista Bebeto Badke (MTb 5498)